Abstract
A aids foi a última pandemia registrada no século 20, com ela todos aprendemos, seja no campo da ciência, seja no campo social.Como médico infectologista tive a oportunidade de participar dessa história recente, viver o drama da falta de informação sobre o vírus, sua origem, formas de transmissão e poder de destruição no organismo humano. Ao mesmo tempo, ocupando essa lacuna da falta de informação científica em bases seguras do início da epidemia, multiplicavam informações leigas calcadas no medo, no preconceito, em respostas simplistas para um fenômeno nada simples. Anos difíceis...Acompanhei nas décadas de 80 e 90 os dramas de pacientes em consultório e em hospitais públicos, suas histórias de vida. À época aprendi a trabalhar com as ferramentas existentes que não eram suficientes para aplacar a dor e dar a esperança da cura àquelas pessoas. Algumas poucas histórias vitoriosas, muitas outras de derrota. Desse período trago comigo a certeza da importância de, como médico, desenvolver um sentimento de alteridade na relação com o paciente. Tentar entender além da doença e seus protocolos, aspectos humanos, individuais, que farão a diferença no sucesso do tratamento.Faz-se necessário destacar que o advento da aids promoveu uma gama de pesquisas que contribuíram para o avanço da medicina e aperfeiçoamento dos sistemas de saúde pública. No campo das ciências sociais, a epidemia derrubou preconceitos, promoveu a inclusão de populações vulneráveis nas políticas de saúde e estabeleceu a necessidade da aproximação dos serviços da realidade dos diversos segmentos sociais. E São Paulo foi protagonista nesse processo. A agilidade na mobilização de profissionais de saúde e na organização dos serviços para fazer frente à nova doença, a incorporação de fármacos e tecnologias de ponta para o tratamento, a participação ativa na pesquisa para uma vacina, são capítulos importantes da história paulista no enfrentamento da aids. Vale destacar que as políticas e ações adotadas pelo estado de São Paulo foram estruturadas e respaldadas pelo Programa Estadual de Doenças Sexualmente Transmitidas e Aids, que completou 35 anos em 2018, e pelo Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids-SP que completa 30 anos de atividades neste ano de 2018.A equipe do CRT (como é mais conhecido) soube se reinventar ao longo das três décadas. Estabeleceu um vínculo forte, transparente e até fraterno com sua clientela, participa ativamente das atualizações do conhecimento científico e atua na vigilância e controle das DST e aids no estado de São Paulo e no Brasil.Essa edição especial do Boletim Epidemiológico Paulista é dedicada a contar a história, desafios, conquistas e perspectivas dessa instituição que integra a Vigilância em Saúde do estado de São Paulo. Não podemos celebrar uma epidemia ainda em curso, mas devemos reconhecer o trabalho dos que estão no fronte de batalha para derrotá-la.
Marcos Boulos - Editor
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