Hanseníase dimorfa e infecção pelo HIV (Aids)

Autores

  • Diltor Vladimir Araújo Opromolla Diretor da Divisão de Pesquisa e Ensino do Instituto Lauro de Souza Lima
  • Cláudio José S. Tonello Diretor da Divisão de Clínica Médica do ILSL
  • Raul Negrão Fleury Patologista do ILSL e Chefe do Serviço de Epidemiologia

DOI:

https://doi.org/10.47878/hi.2000.v25.35378

Palavras-chave:

Hanseníase, Infecção pelo HIV, Reação Tipo 1, Aids

Resumo

Uma paciente Jovem, de cor branca apresentando dor na perna esquerda e uma placa no membro superior esquerdo com distúrbios de sensibilidade, baciloscopia + e com diagnóstico de hanseníase VT, iniciou tratamento com a PQT/OMS para MB. Três meses após o inicio do tratamento, apresentou surto reacional (Reação tipo 1)com acentuação da infiltração e do edema na lesão inicial e o aparecimento de várias outras placas, também eritematosas, disseminadas por todo o tegumento. Nessa ocasião, a dor na perna continuava e não parecia relacionada com a Hanseníase. Pelo fato da eletroneuromiografia ter sido inconclusiva, foi realizada uma ressonância magnética que acusou um neurinoma no nível da 4a vértebra lombar que a histopatologia mostrou tratar-se de um schwanoma benigno. O tumor foi retirado cirurgicamente e a dor desapareceu. Algum tempo depois do episódio reacional, foi constatado que a paciente estava infectada pelo HIV e com diminuição importante de linfócitos CD4+. Ela evoluiu bem com o tratamento para ambas as condições e as lesões de hanseníase desapareceram. Após a alta a paciente sofreu nova reação reversa (Reação tipo 1), coincidindo com alteração do seu esquema para a aids, e foi  reiniciado o tratamento para hanseníase com rifampicina, ofloxacin e dapsona, que durou 4 meses, com melhora do quadro. Os autores chamam a atenção para que sempre seja feito o exame minucioso dos nervos, pois os sintomas neurológicos, que na vigência da hanseníase são geralmente atribuídos a ela, podem ser devidos a outras patologias Eles também tecem comentários sobre o aparecimento e a patogênese dessas reações tipo 1 nesse e em outros casos. Esses episódios reacionais, segundo osautores, com freqüência estão relacionados com intercorrências como neoplasias de pulmão, tuberculose, diabetes, hepatites e outras, que trazem como conseqüência uma alteração do estado imunitário do indivíduo. No caso estudado, a associação com a aids vem corroborar essa afirmação, visto a imunodeficiência que ela provoca. As reações tipo 1, então, seriam o resultado da multiplicação de bacilos que se mantinham no tecido como persistentes, e que, uma vez destruídos pela terapêutica ou pelo sistema imunológico do paciente, exporiam antígenos que desencadeariam o fenômeno de hipersensibilidade. Quando essa multiplicação bacilar e a reação ocorrem após a interrupção do tratamento, os bacilos, por serem em geral em pequeno número, são facilmente eliminados pelo organismo, não havendo, então, necessidade de tratamento. Nos casos, contudo, em que a imunidade celular não é alta, pode acontecer que ela não seja suficiente para destruir todos os bacilos e, consequentemente, os bacilos que restarem seriam responsáveis por mais episódios reacionais. Isso, provavelmente, é o que iria acontecer com a paciente neste caso, que apresentava certo grau de imunodepressão devido à aids, e, por essa razão, foi reiniciado o seu tratamento. A rifampicina e o ofloxcin, que foram utilizados no novo esquema, tiveram como finalidade usar duas drogas bactericidas para eliminar os bacilos que viessem a se multiplicar novamente. Quanto ao tempo de tratamento que foi de 4 meses, está relacionado com a possibilidade da rifampicina, por ser altamente bactericida e atuar rapidamente, destruir grande parte dos bacilos, mas interromper a multiplicação dos outros que restaram, impedindo a ação do ofloxacin que atua de maneira mais lenta. Se o tratamento fosse interrompido logo após o primeiro mês, os bacilos tornados persistentes pela ação da rifampicina, voltariam a se multiplicar mais tarde. A dapsona foi adicionada ao esquema porque no início os autores tinham a intenção de continuar com essa droga indefinidamente, mas resolveram suspende-la e aguardar a evolução da paciente. Apesar de, até agora, não haver evidências de umainfluência da aids na evolução da hanseníase, seja quanto a resposta ao tratamento ou a alterações clínicas, este caso poderia ser demonstrativo de uma possível associação entre as duas doenças.

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Referências

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Publicado

30-06-2000

Como Citar

1.
Opromolla DVA, Tonello CJS, Fleury RN. Hanseníase dimorfa e infecção pelo HIV (Aids). Hansen. Int. [Internet]. 30º de junho de 2000 [citado 29º de março de 2024];25(1):54-9. Disponível em: https://periodicos.saude.sp.gov.br/hansenologia/article/view/35378

Edição

Seção

Estudos clínicos

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